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Pé Frio

Era sexta-feira   do dia quatorze de dezembro de mil novecentos e lá vai bolinha.             Alberto se despede da turma do trabalho e vai correndo para o boteco do Manoel tomar exatos três copos de cerveja antes das seis e quarenta e cinco. Logo depois, ele corre para o boteco do Antônio e toma cinco pingas. Uma para cada gol convertido no pênalti.  Alberto é apaixonado por futebol e maluco pelo time de coração, o América do Rio. Este amor todo é graças ao pai, o senhor Alaor. No parto do Alberto, Alaor aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo não queria deixar o médico fazer a cirurgia só por quê era flamenguista. O Flamengo tinha vencido o América na final do carioca naquele ano. Por conta disso, ele preferiu desembolsar quatrocentos e cinco reais a mais no parto para ter um médico tricolor, vascaíno ou até mesmo botafoguense. Se achasse um por aí.              Alberto não era só apaixonado pelo time. Ao longo dos anos ele criou várias superstição antes dos jogos decisivos.

Intimidade

Essa história é meio louca. Mas acredite, aconteceu. Não comigo. Mas com pessoas que estavam na mesa ao lado. Sim. Eu prestei atenção no papo da mesa ao lado. A conversa estava tão legal que não resisti.              Era mais ou menos quatro horas da tarde. O momento ideal para relaxar na cafeteria. Nunca vou sozinho. Sempre levo comigo todos os meus amigos. E olha que nem é tão grande o ambiente. Mas todo mundo vai.              Estava eu lá. Sentado. Tomando um cafezinho bem amargo por sinal. De repente, lá da porta escuto um grito.              - Miiiiiiiiiigggggaaaaaaaaaa. Quanto tempo.              Do nada, num pulo do gato, uma pessoa atrás de mim levantou com as mãos erguidas.               - Fernanda? Ué, você aqui?               Não sei você, mas a essa altura eu já tinha percebido que eram duas amigas que estavam há um bom tempo sem se ver. Por acaso se encontraram ali. Aproveitaram pra botar as fofocas em dia.               - Conte-me "miga", o que você anda

Crise

Eles não se viam há muuuuuuuuito tempo. Tinha uns...              - 10 ANOS? - gritou Marcos.              - O tempo voa! - respondeu Souza.              Eram grandes amigos no tempo de faculdade. Tinham se conhecido no dia do vestibular. Ingressaram juntos no curso de direito. No quarto período, Marcos passou para polícia militar e largou os estudos. De lá pra cá cada um seguiu o próprio caminho.  O tempo fez questão de afastá-los. Até que naquele dia na fila do açougue...              -  E o casamento? - perguntou Marcos.              - Crise. - disse Souza em um alto tom.              - Normal.              - E o trabalho? Advogado, né?              - CRISE!              - Difícil em. E o seu Vascão em...              - CRISE! CRISE! Tá em crise! - bravejou Souza              - Que maré em. Bom, pelo menos a saúde tá boa, né?              - Crise também. Crise de rim. Crise de sinusite. É crise que não acaba mais.              Marcos já não sabia o que falar mais. Por

Histórias

Naquele dia o filho pediu ao pai para contar uma outra história. Já não aguentava mais ouvir a chapeuzinho vermelho, os três porquinhos, a bela adormecida. Tinha crescido. Queria ouvir uma história com tiro, sangue e morte. O pai ficou surpreso na hora. Mas presenciava ali o crescimento do filho.            O problema era que o pai não sabia nenhuma história com todo esse enredo. Não costumava ler livros ou ver filme. A única coisa que fazia ao chegar do trabalho era ligar a tv e assistir o jornal. Mesmo assim não queria decepcionar a criança. Tentou improvisar.            - Era uma vez um monstro que vivia na caverna de uma pequena cidade...PAI, PAI - O menino interrompeu.            - Não. Não. Monstro é coisa de criança. Quero algo real, pai. Real. Lembre-se: tiro, sangue e morte.            - A história começa com uma menina que descobriu ser filha do Diabo. Em uma noite de lua cheia ela pegou a faca e...CHATO - gritou o filho.            - Em um bairro de uma grande cid

Escritor sem história

O relógio marcava 4:50am, Alan permanecia ali, sentando, fumando seu último charuto cubano e olhando fixo para a tela do computador. Falava para si mesmo - Só preciso começar. Qualquer palavra. Qualquer coisa. Uma hora a ideia aparece. - Baforou uma enorme quantidade de fumaça e continuou ali, parado.             Aquela altura do campeonato pedir calma não ajudaria. Alan é um famoso escritor de um tradicional jornal da sua cidade. Escreveu muitas histórias durante anos e anos. Mas com o tempo foi perdendo o brilho e o talento. A crise financeira estava varrendo todo mundo. Ele sabia que mais cedo ou mais tarde seria o próximo a dizer adeus. Não era hora de vacilar. A idade não permitia isso. Tinha que entregar a sua história as 6 da manhã para ser aprovada as 6:10, revisada as 6:20, aprovada de novo as 6:30,  enviada para os publicadores as 6:40, revisada na tela do site as 6:50 e publicada as 7 em ponto. E já era 5 horas.              Depois de mais uma baforada escreveu sua primeir

Amigos

Era de costume aos sábados, por volta das 19 horas,  Roberto atravessar a rua de casa e sentar no bar para tomar uma gelada e comer o famoso feijão com torresmo do seu Batista. Gostava de ficar sozinho refletindo a vida, a carreira, a família e a morena que passava sempre por ali na volta do salão. A única coisa que ele falava naquele momento de concentração era - Batista, mais uma, por favor -  Batista era o dono do bar. Conhecia tão bem o Roberto que já deixou levar algumas garrafas para casa e devolver no dia seguinte.             Já era final do expediente do Roberto. Ele estava levantando para ir até o balcão e acertar com seu Batista.              - Roberto?              Olhou para lado e não reconheceu a voz.              - Roberto!! Você por aqui? Quem diria em...              Roberto não desviava o olhar. Roberto não piscava. Roberto não movia. Ali ficou. Parado como se tivesse hipnotizado. O homem da voz levantou, abriu os braços e foi em direção ao Roberto - que nada

Banco é tudo igual

Quem nunca leu ou ouviu que pesquisadores de uma universidade lá da casa do baralho descobriu algo novo na ciência? Quase todos os dias a gente escuta isso. Nunca duvidei dessas pesquisas. Juro!              Tá certo que ao longo dos anos tenho visto muitas coisas estranhas. Pesquisadores da Universidade de Tal Lugar descobre que ficar acordado 12 horas 30 minutos 39 segundos faz bem para o calcanhar do pé direito. Ou melhor, pesquisadores da Universidade do Outro Lado do Mundo descobre uma nova vacina contra  λαβυρινθίτιδα.  O importante dessa história toda é que a ciência está evoluindo a cada dia. Mesmo não entendendo muito bem e nem sabendo exatamente a sua procedência.              De tanto viver nesse mundo de pesquisa resolvi fazer a minha. E agora vou compartilhar com você o que talvez seja a maior descoberta da humanidade até o momento. Um dia, quem sabe, venha perder para o enigma do ovo e a galinha. Eu disse, um dia.  O que você vai descobrir ali na frente não é um fato